Terra de leite, mel e petróleo
Israel possui uma das maiores reservas de xisto betuminoso da Terra, e a quantidade de petróleo extraível do querogênio existente nessas rochas praticamente rivaliza com a da Arábia Saudita. O país pode conquistar a independência energética e mudar o xadrez político do Oriente Médio. Mas o custo ambiental é alto.
por Eduardo Araia
Uma piada popular entre os israelenses começa com a pergunta: por que Moisés demorou 40 anos para levar os judeus do Egito a Israel? Resposta: porque estava procurando o único lugar no Oriente Médio que não tinha petróleo nem gás. Pela via cômica revela-se uma das grandes vulnerabilidades de Israel, país com recursos energéticos nulos, enquanto a maioria das nações que o cercam nadam em petróleo. A dependência externa em relação ao combustível fóssil (praticamente 100%) e ao gás natural (70%), em meio a vizinhos no mínimo pouco dispostos a ajudá-lo, constitui há décadas um obstáculo logístico para lá de complicado. Esse quadro pode mudar radicalmente.
A sorte da bíblica "terra que mana leite e mel" no setor de hidrocarbonetos começou a virar em 2009, ano da descoberta de um grande campo de gás natural na costa do Mediterrâneo, denominado Tamar, com reservas estimadas em 240 bilhões de metros cúbicos. No ano seguinte veio uma nova surpresa agradável: outro campo no litoral, Leviathan, com reservas em torno de 450 bilhões de m³. Com entrada em operação comercial prevista respectivamente para 2012 e 2015, Tamar e Leviathan devem suprir todas as necessidades de gás de Israel por 50 anos.
Na verdade, as boas notícias estavam só começando. Enquanto as sondagens eram feitas, a empresa Israel Energy Initiatives (IEI), subsidiária da companhia de telecomunicações norte-americana IDT, aprofundava suas pesquisas sobre outra possibilidade: xisto betuminoso. No início da década de 1980, um estudo do Serviço Geológico de Israel havia assinalado que o país pode conter um dos maiores depósitos do mundo de xisto, com boas quantidades de querogênio, um complexo orgânico que contém petróleo.
Uma das perfurações da empresa Israel National Oil, em Arad, na região do Mar Morto.
|
A IEI começou em 2009 a fazer perfurações numa área de 238 km² que obteve em licenciamento e, por enquanto, os resultados que obteve batem com "as mais altas expectativas" da empresa. As avaliações reforçam projeções de geólogos da IEI de que os depósitos de xisto betuminoso de Israel podem colocar o país numa posição proeminente entre os grandes produtores de petróleo do mundo.
"Numa estimativa conservadora, cerca de 250 bilhões de barris de petróleo estão contidos no xisto israelense - provavelmente o segundo ou terceiro maior depósito de todo o mundo", afirma o físico Harold Vinegar, cientista-chefe da IEI. "A Arábia Saudita (maior produtora global de petróleo) possui reservas de 260 bilhões de barris. Poucas pessoas perceberam que a indústria petrolífera aqui tem um tremendo potencial."
Vinegar merece ser levado a sério. Ex-funcionário da gigante anglo-holandesa Shell, onde trabalhou por 30 anos e foi cientista-chefe, participou ativamente da pesquisa da empresa com xisto betuminoso no supercampo da Bacia de Piceance, no Colorado (Estados Unidos). Ali se estima haver cerca de 800 bilhões de barris de petróleo recuperável, a uma profundidade média de 300 metros. A Shell ainda não extraiu petróleo do xisto do Colorado em bases comerciais, sobretudo por um problema ambiental - o principal aquífero da região de Piceance passa através do depósito de xisto. Mas foi ali que Vinegar desenvolveu uma técnica para baratear o custo da operação que está prestes a ser posta em prática (ver quadro a seguir).
Como tirar óleo de pedra
Extrair petróleo de xisto betuminoso é uma atividade cara e poluente. O método tradicional é o da mineração a céu aberto, cuja viabilidade econômica aumenta se a rocha estiver próxima da superfície. O xisto retirado é então aquecido entre 450°C e 500°C, para que o querogênio nele contido se converta em petróleo leve, de boa qualidade. O custo final do barril obtido por esse processo varia entre US$ 70 e US$ 100 - muito alto, numa época em que o preço do barril em Nova York ronda US$ 85.
Harold Vinegar afirma ter uma alternativa mais vantajosa, que desenvolveu para a Shell dos Estados Unidos. Ela envolve aquecedores horizontais que, colocados nos veios, trabalham a altas temperaturas, sem variações, durante meses. Com o calor liberado, as rochas circundantes levam três anos para transformar querogênio em petróleo, que pode ser bombeado para a superfície.
No projeto da IEI, os aquecedores seriam inicialmente alimentados por eletricidade obtida a partir do gás, abundante e barato nessas áreas, além de emitir quantidades relativamente baixas de gás carbônico. Depois, os aparelhos seriam substituídos por barras de sal fundido, igualmente caloríficas, uma tecnologia mais eficiente já empregada no subsolo de fábricas de produtos químicos e usinas de energia solar. Vinegar calcula que o barril de petróleo extraído dessa forma poderia custar até US$ 35.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário