Arte de Nascer
O nascimento é uma operação simples nos países com menores taxas de mortalidade e de complicações pós-parto, como Japão, Holanda, Inglaterra e Suécia. Já o Brasil sofre excesso de medicalização: as maternidades privadas parecem hotéis ou empresas. São raros os obstetras que "permitem" à mulher assumir a posição que quiser para dar à luz. Há evidências de que se sentir protagonista nessa hora deter
por Ieda Estergilda de Abreu
O nascimento é uma operação simples nos países com menores taxas de mortalidade e de complicações pós-parto, como Japão, Holanda, Inglaterra e Suécia. Já o Brasil sofre excesso de medicalização: as maternidades privadas parecem hotéis ou empresas. São raros os obstetras que "permitem" à mulher assumir a posição que quiser para dar à luz. Há evidências de que se sentir protagonista nessa hora deter
por Ieda Estergilda de Abreu
Ter filhos sem intervenções, com poucos medicamentos, sem anestesia ou cortes na região perineal, a grande maioria das mulheres, sem dúvida, consegue. Ao longo da história foi assim. Gravuras antigas mostram mulheres ajoelhadas, de cócoras ou em banquinhos baixos, com as costas na posição vertical. Até o começo do século passado, muitas preferiam a assistência da parteira, tida como mais segura e conveniente. O parto horizontal foi introduzido sob a influência da escola obstétrica francesa, liderada por François Mauriceau. Desde que ele passou a ser hospitalar, feito somente pelos médicos, as opções foram restringidas a parto natural ou cesariana, a verticalização foi substituída pela posição ginecológica e o corte embaixo passou a ser realizado sem questionamentos.
A simplificação desse atendimento começou na Europa e nos Estados Unidos e veio para o Brasil nos anos 1950. Hoje, 80% dos partos realizados nas maternidades particulares e 27% dos realizados nas maternidades públicas são cesáreas, contrariando a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de não ultrapassar a taxa dos 15%.
Mas, mesmo com toda a tecnologia dos hospitais, a cesárea ainda é considerada uma intervenção de risco. Não é à toa que existe um movimento pela retomada do parto natural promovido por obstetras preocupados com o excesso de medicalização e por grupos de mulheres que reivindicam melhores condições para ter seus bebês.
“Quando bem utilizada, a tecnologia reduz efetivamente a morte de mães de bebês, mas o excesso de intervenções acaba gerando mais malefícios que benefícios”, diz a médica epidemiologista Daphne Ratter, professora do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília, que alerta para a ocorrência de uma inversão. “Quando se ultrapassa e se começa a utilizar uma tecnologia indicada para casos de risco em pessoas que não têm risco nenhum, o mais provável é que se induza ao surgimento de um problema onde ele não existia.”
Na verdade, há várias técnicas graduais de parto amigável e participativo para mulheres que desejam compartilhar o nascimento dos seus filhos.
Leboyer | O obstetra Frédérick Leboyer, ainda ativo na França, foi um dos pioneiros na defesa de uma forma menos violenta de nascer e da importância do vínculo mãe-filho no parto. Introduzido no Brasil em 1974 pelo médico Claudio Basbaum, do Hospital São Luiz, em São Paulo, o parto Leboyer é feito com pouca luz, muito silêncio e massagem nas costas do bebê, que não recebe a famosa palmada “para abrir os pulmões”. Além disso, o primeiro banho é feito próximo à mãe e a amamentação precoce é estimulada. O foco é o recém-nascido.
Nesse tipo de parto, a mulher continua deitada de costas, com as pernas apoiadas em estribos, e é realizada a episiotomia, uma incisão no períneo (a região muscular entre a vagina e o ânus) para ampliar o canal do parto, em geral com anestesia local.
De cócoras | Sob o foco da liberdade de movimentos para as mulheres, o parto de cócoras ou ativo é bem aceito. Mais rápido, dado o auxílio da gravidade, é mais saudável para o bebê e evita a compressão de importantes vasos sanguíneos, o que acontece com a mulher deitada de costas. Agachada, ela pode se apoiar nos ombros e nos braços do companheiro, que exerce papel decisivo tanto físico quanto psicológico.
A técnica é indicada para mulheres que tiveram gravidez saudável, sem problemas de pressão e também se o feto estiver na posição cefálica correta (com a cabeça para baixo). O médico curitibano Moysés Paciornik (1914-2008) promoveu essa modalidade no Brasil inspirado nas índias da tribo caingangue. Juntamente com seu filho, Cláudio Paciornik, inventou uma cadeira para ser usada em hospitais que permite várias posições para a mãe.
Em Londres (Inglaterra), a educadora perinatal Janet Balaskas lidera um movimento pelo parto ativo trabalhando com gestantes em aulas de ioga. Após anos de prática, ela observa que depois da preparação física e psicológica raramente ocorrem depressões pós-parto, problemas com a amamentação ou com a recuperação da parturiente. Para Janet, a grávida tem de esquecer o calendário de papel e se concentrar no calendário do seu corpo.
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